Clemente Nobrega - Artigo publicado na Revista Época Negócios – Nº 18 – Agosto 2008 – Coluna INOVAÇÃO.
A história é conhecida: o boteco começa a fazer sucesso graças às receitas do dono: bolinho de bacalhau, pasteizinhos, casquinha de siri... Além do ótimo produto, o cara tem vocação para serviço - sabe nome e preferências de todo mundo e serve o "chopp mais bem tirado do Brasil". O lugar vira point. Um “puxadinho”, mais algumas mesas, e passa a servir refeições simples. Mais sucesso. Notando a chance de crescer, o dono abre outro ponto, depois outro, e então... quebra ou é forçado a encolher. Por quê? A razão é a mesma pela qual você não vê “Clínicas Ivo Pitanguy” espalhadas pelo mundo, nem cadeias de restaurantes de “haute cuisine”. O que você vê espalhadas pelo mundo são lanchonetes McDonald's. O talento do dono do boteco (ou do chef do restaurante francês) é como o do Pitanguy - difícil de ser codificado e, por isso, difícil de ensinar. O criador do conceito tem que estar fisicamente no local da prestação do serviço. Atividades assim são sempre negócios pequenos - são mais griffe (Louis Vuitton) do que escala (Wal Mart). Negócios grandes têm que poder ser operados por gente menos sofisticada do que o criador do conceito (gente menos complexa, como se diz tecnicamente). Para que isso possa acontecer, o conhecimento do criador tem que ser replicável para a ponta da operação. Henry Ford era complexo, os operários da sua linha de montagem, eram simples. Ray Kroc era complexo, os operadores McDonald's são simples. Escala e complexidade não podem aumentar juntas - quanto mais de uma menos da outra. A causa é a física disso que chamamos de informação - uma noção científica, ao contrário de outras como “estratégia” ou “qualidade”. As maiores empresas do mundo são “escala” (claro né?) - operadas por gente boa em reproduzir soluções-padrão (como o McDonald's faz), não em desenhar soluções caso-a-caso (como a McKinsey faz). Há níveis diferentes nesse trade off. Pense na GE de Jack Welch - pouco engessada na operação, engessadíssima nas normas corporativas (das quais Welch cuidava pessoalmente). Hoje, é verdade, a média da “inteligência” na ponta tem que ser muito maior do que na época de Henry Ford (o operário burro foi substituído por um robô). Isso ocorre porque ninguém consegue mais processar sozinho, à la Ford, a quantidade de informação necessária para operar uma empresa global. O talento está em arquitetar sistemas em que haja algum engessamento para garantir a escala, mas não tanto que elimine a necessidade de se fazer avaliações subjetivas na ponta. Gestão da inteligência é a gestão das competências adequadas para operar segundo a máxima de Einstein: “simplifique o máximo que puder, mas não vá além disso”. Sempre que me deparo com operações de larga escala que começam a ter problemas, desconfio logo de encaixe inadequado entre as competências dos operadores e o grau de engessamento necessário para que eles operem bem. Provavelmente, estão tendo de fazer avaliações para as quais não têm competência (perfil errado; falta de treinamento). É batata!
Um comentário:
Bom o texto heim!!
Muito bom.
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