Segue texto que recebi mostrando como modelos de colaboração tipo Wikipédia podem mudar o mundo corporativo. Vale a pena ler.
Colaboração via Internet segue modelo da Wikipédia e pode mudar a forma como fazemos negócios
Publicado em: 3/7/07 Fonte: wharton@universia.net
Parece coisa saída de thriller futurista de TV: espiões americanos frustram o próximo ataque terrorista à la 11 de setembro através de uma comunidade online compartilhada e estruturada de forma semelhante à Wikipedia, a enciclopédia virtual gratuita desenvolvida pelos próprios usuários. Contudo, Anthony D. Williams, co-autor de um novo livro: Wikinomia: como a colaboração em massa muda tudo (Wikinomics: how mass colaboration changes everything), disse recentemente em conferência proferida na Wharton que essa comunidade online de espiões já existe, e está em plena atividade.
“A comunidade nacional de inteligência foi muito criticada depois do 11 de setembro por não ter sabido ler nas entrelinhas”, disse Williams, responsável pela palestra de abertura do 9º. Encontro Anual de Atualização em Tecnologias Emergentes, patrocinado pelo Centro Mack de Inovação Tecnológica da Wharton (Mack Center for Technological Innovation). “Agora, a comunidade nacional de informações se pergunta: ‘Será que podemos aprender alguma coisa com a Wikipédia? Seria possível compartilhar conhecimentos entre uma organização e outra?’ Na verdade, já temos a Intellpedia, que é um projeto real. Obviamente não está aberta ao público.”
A Intellpedia pode estar fechada, porém outros sites — voltados para o uso comunitário e estruturados em torno de conteúdos gerados pelos usuários — não somente se acham abertos a todos, como também prosperam, como é o caso, entre outros, do Flick.com, um site de fotografias públicas, e do Craigslisst.org, o site de classificados com maior número de anúncios gratuitos, e que hoje atrai mais visitantes do que sites de empregos tradicionais, como o Monster.com. Em Wikinomics, escrito por Williams em parceria com Don Tapscott, os autores prevêem que projetos de criação e de colaboração em rápido crescimento nos moldes da Wikipédia “abrirão a economia” e revolucionarão a forma como os negócios serão feitos no século 21.
“Quando digo ‘abrir a economia’, refiro-me ao fato de que pessoas comuns agora têm acesso à tecnologia, o que lhes permite criar valor e realizar trabalhos em mútua colaboração, ombreando inclusive com as maiores empresas do mundo”, disse Williams. “Essa nova face da economia mudará a forma como inventamos, produzimos, projetamos e distribuímos produtos no mundo todo.”
A palestra de Williams suscitou perguntas contundentes, e um certo ceticismo aqui e ali na platéia. Muita gente colocou em dúvida a possibilidade de que grandes contingentes de usuários, utilizando ferramentas online de código aberto, sejam capazes de desenvolver soluções melhores do que as criadas por pequenos grupos de especialistas. Uma pessoa levantou a possibilidade de que os esforços de colaboração acabem sendo facilmente manipulados. “Veja, por exemplo, o caso da indústria do petróleo e o problema do aquecimento global, ou mesmo a guerra do Iraque. Não creio que haja indício algum de que as pessoas estejam tomando decisões mais certas, apesar de toda a informação de que dispõem”, observou.
Crescimento da Internet: um caso de “tempestade perfeita”
Williams observou durante sua palestra que até ele mesmo e Tapscott, co-autor da obra e chefe do think tank New Paradigm, de Toronto, do qual Williams é vice-presidente e diretor executivo — não tinham idéia do potencial do seu estudo quando, em 2002, começaram a pesquisar o impacto da Internet sobre o mundo corporativo. As pesquisas foram ganhando corpo com o passar do tempo até atingir o patamar de 9 milhões de dólares financiados por várias empresas clientes do think tank.
Os autores do que se tornaria por fim o Wikinomics tentavam rastrear um alvo que se deslocava velozmente; na verdade, a Wikipédia nem sequer existia quando o projeto começou cerca de sete anos atrás. A enciclopédia online foi lançada em janeiro de 2001 e utiliza o software wiki, desenvolvido em meados dos anos 90. (Um “wiki” é simplesmente um site de Internet que permite aos visitantes introduzir, remover ou editar e modificar o conteúdo disponível).
Hoje, a Wikipédia atrai a colossal cifra de sete bilhões de visitas ao mês, tendo sido traduzida em mais de dez idiomas. Embora o projeto tenha sido alvo de publicidade negativa devido a incidentes provocados por “vândalos” virtuais, que postaram deliberadamente informações falsas no site, vários estudos concluíram que a exatidão das informações contidas na Wikipédia é similar à da prestigiosa Enciclopédia Britânica, embora a enciclopédia eletrônica conte com um número de entradas cerca de dez vezes maior.
O conceito, entretanto, não é totalmente novo. Possivelmente o projeto de código aberto mais influente ainda hoje seja o sistema operacional Linux, desenvolvido em parceria por cientistas da computação a partir do início dos anos 1990. Atualmente, ele é utilizado não só por milhões de pessoas, mas também por empresas como a Motorola e a BMW. Williams salientou que a ascensão da Wikipédia e do Linux — e de outras plataformas geradas pelo próprio usuário, como é o caso do mercado eletrônico eBay, e dos cursos online cada vez mais populares do MIT — não é forma alguma acidental, e sim parte do que ele chama de “tempestade perfeita” do crescimento da Internet. (As tempestades perfeitas são fenômenos atmosféricos que ocorrem duas ou três vezes a cada século).
Os principais ingredientes dessa tempestade, disse ele, são os avanços tecnológicos — geralmente referidos como “Web 2.0” —, que tornam mais fáceis a colaboração online e a comunicação, bem como o advento de uma geração de usuários de Internet nascidos de 1980 em diante, e que insiste em participar de forma mais ativa na criação ou na edição do conteúdo online que utiliza.
Williams destacou que um dos entrevistados para o Wikinomics, Josh Peterson, editor de cinema freelance, disse-lhe que as mudanças rápidas ocorridas na Internet lembram a história do cinema. “Peterson disse: ‘Nos primeiros tempos do cinema, a tecnologia chegara a um ponto em que você não precisava ser um técnico de verdade para rodar um filme. Foi nesse ponto que a tocha da criatividade passou do técnico para o roteirista. Creio que você concorda comigo que hoje temos filmes muito melhores por causa disso.’”
Praças públicas x jardins murados
Os traços característicos da Internet do ano 2000 para cá — principalmente a capacidade do usuário de criar conteúdo e formar comunidades de interesses comuns — criaram o que Williams chamou de “praças públicas” em contraste com o que chamou de “jardins murados” da Internet pré-ano 2000. As mudanças são impulsionadas pelos usuários jovens, extasiados com a variedade de opções oferecidas pela Internet, mas que também avaliam cuidadosamente as empresas que produzem os bens consumidos por eles. Os autores de Wikinomics constataram que 65% dos integrantes dessa nova geração de consumidores online deseja estabelecer uma relação de mão dupla com as marcas de sua preferência. Eles querem proporcionar feedback às empresas e também contribuir diretamente com o produto.
Williams levou para o evento provas incontestáveis de como os sites em que há maior colaboração, como o Digg.com, voltado para assuntos de tecnologia, já ultrapassaram sites mais tradicionais e hierarquizados, como o rival Slashdot.org. Apresentou ainda projetos de Internet mais novos que permitem vislumbrar como será o futuro em uma era denominada pelos autores de “produção entre pares”.
Exemplos:
1. Marketocracy.com, uma ferramenta de investimentos em que cerca de 70.000 pessoas criam carteiras de ações virtuais. Os resultados das 100 participantes de melhor desempenho servem de referência para um fundo mútuo do mundo real, que, normalmente, tem um desempenho superior ao índice da Standard & Poor’s, composto pelas ações de 500 grandes empresas.
2. “Ideagoras” — onde cientistas e desenvolvedores de produtos compartilham abertamente idéias que propiciam novos avanços. Um excelente exemplo desse conceito é a InnoCentive, ancorada na Internet e focada em pesquisas de negócios. O projeto conta com a participação de cientistas do mundo todo para a resolução de problemas específicos que podem redundar em ganhos polpudos para os participantes. Williams disse que a Procter & Gamble, empresa monumental de bens de consumo, é uma das principais incentivadoras da InnoCentive, embora disponha de 9.000 funcionários dedicados à pesquisa.
3. O chamado “chão de fábrica global”, que permite a colossos industriais como a fabricante de aviões Boeing recorrer à Internet para redefinir sua relação com os fornecedores. Williams disse que o novo jato da Boeing, o 787 “Dreamliner”, é resultado de um esforço de colaboração intenso com os fabricantes de peças. Com isso, as especificações elétricas, que geralmente ocupavam 2.000 páginas, foram reduzidas agora a 20.
4. O Second Life, o mundo virtual cada vez mais popular desenvolvido pelo Linden Lab, de São Francisco, dá aos participantes a possibilidade de criar avatares semelhantes aos seres humanos, que interagem socialmente e usam um tipo de dinheiro, “dólares Linden”, para comprar propriedades virtuais. Williams destacou que a Suécia chegou mesmo a abrir uma “embaixada virtual” no Second Life, com a idéia de atrair turistas.
O Second Life é um exemplo do que os autores chamam de “prossumidores”, isto é, consumidores que desempenham um papel objetivo na relação que mantêm com o produto. Williams destacou que as marcas tradicionais de bens de consumo trabalham cada vez mais com esses “prossumidores”, e citou o caso da Doritos, o popular salgadinho de tortilla, que pediu recentemente a seus clientes que criassem centenas de peças publicitárias em casa, exibindo-as em seu site e levando ao ar as mais votadas durante o Super Bowl.
Entretanto, é evidente que existem arestas a serem aparadas na transição para a wikinomics. Enquanto Williams dava sua palestra, por exemplo, o Los Angeles Times informava que o concurso da Doritos havia sido encampado por profissionais, e que quatro dos cinco finalistas eram cineastas que haviam trabalhado em agências de publicidade ou tinham produzido comerciais no passado. Já a propriedade intelectual de algumas das descobertas feitas pela InnoCentive são alvo de disputas.
Ironicamente, Williams admitiu que ele e Tapscott haviam deparado com uma certa resistência quando tentaram criar um entrada na Wikipédia para o termo wikinomics. Os editores voluntários da enciclopédia alegavam que o nome parecia “mais um neologismo — e não algo de conhecimento público. Como o Google registrou entre 40 e 50 ocorrências apenas, o termo não merece constar da Wikipédia.” A entrada foi apagada.
Williams disse que ele e Tapscott sentiram-se desanimados a princípio, mas depois que o livro foi publicado, submeteram novamente o termo, que desta vez foi aceito — uma metáfora, talvez, do que os autores esperam que seja o reconhecimento cada vez maior dos sites de colaboração da Internet como uma força econômica em ascensão.
Citando o trabalho de Yochai Benkler, professor de Direito de Yale, Williams disse que “na Era da Informação, existe um novo modo de produção emergente que não corresponde ao formato hierárquico que todos conhecemos desde a Revolução Industrial. Tampouco apresenta as mesmas características do mercado capitalista em que as pessoas contratam serviços. Trata-se de um modo fluido de produzir valor”.
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