5.11.07

A importância da reciprocidade

Todo homem quando exerce uma atividade ou trabalho sempre exige algo em troca. Isso é verdade no âmbito privado de nossas vidas como também no âmbito profissional. Nós exigimos sempre alguma coisa em troca pela nossa amizade. Pode ser uma atenção, respeito. No trabalho além do salário, exigimos reconhecimento, oportunidade de crescimento, conhecimento, etc. Isso é devido ao fato reciprocidade que é inerente ao ser humano.

Abaixo segue um trecho de uma matéria da capa que extraí da revista Época Negócios de outubro de 2007. Achei muito interessante.

Quando formos cobrar de nossos colaboradores resultados melhores, mais dedicação e empenho, lembre-se de fazer a pergunta: O que a empresa vai dar em troca? Vale a pena falar que apenas um aumento na remuneração não será suficiente.


A reciprocidade
Para acessar todo o texto da revista Época Negócios, clique aqui.

A vida em grupo exige reciprocidade e em toda parte caçadores-coletores agem de acordo com essa lógica – "para minha família primeiro, se sobrar, para a sua". Para estranhos (que vão concorrer pela mesma girafa), a morte. A agricultura foi a tecnologia (social) decisiva para a civilização porque levou à divisão do trabalho em larga escala. Rompeu a mentalidade "soma zero" do bando, e ele virou vila, cidade, reino. Ao admitir a entrada de estranhos no bando, a agricultura resolveu um problema complicadíssimo: coordenar e motivar muita gente com vistas a um objetivo comum.

A reciprocidade veio sendo programada em nós desde tempos ancestrais. Uma descoberta recente é a importância disso que podemos chamar de "senso de justiça", algo baseado na noção de reciprocidade. "Eu te ajudo hoje, mas espero a contrapartida amanhã." Numa série muito engenhosa de experimentos, Leda Cosmides e John Toby, da Universidade da Califórnia, mostraram que o animal humano é programado pela evolução para detectar injustiça. Confi ança (trust) e detecção e punição da injustiça estão no coração da sociedade, no centro da idéia de civilização.

Fiquei perplexo ao tomar conhecimento disso. Eu já havia percebido que esse tema (reciprocidade- justiça-confi ança) é o eixo central em qualquer comunidade inovadora. A percepção de que "as coisas são injustas por aqui" corrói e trava tudo. É um pecado mortal. Jack Welch conta como uma experiência, logo no início de sua carreira na GE, moldou sua visão sobre como pessoas devem ser gerenciadas: um prêmio em dinheiro, sempre no mesmo valor, distribuído por toda a organização fez com que ele pedisse demissão (depois reconsiderou), pela revolta de ver pessoas desiguais tratadas igualmente. Injustiça! Injustiça! Meritocracia – a cada um de acordo com seu desempenho – foi um dos pilares da filosofia de Welch como CEO da GE.

Confiança e punição da injustiça são tão importantes para os humanos que, muitas vezes, preferimos nos prejudicar pessoalmente para impedir uma "injustiça". Outro desses experimentos fartamente documentados dá conta da seguinte situação: duas pessoas devem dividir uma soma em dinheiro (R$ 100, digamos). Para que possa haver a partilha, ambas têm de concordar. Uma delas propõe quanto cada uma vai receber, e a outra aceita ou rejeita. Se rejeitar a proposta, ninguém ganha nada. Seria de esperar que mesmo um rateio de 99/1 fosse aceito, porque, racionalmente, R$ 1 é melhor do que nada. Na prática, porém, pouca gente aceita uma divisão menor do que 70/30. Se você ousa propor menos que isso, o outro jogador veta a partilha e prefere ficar sem nada. O considerado "justo" é 50/50, meio a meio. Qualquer outra coisa é percebida como violação da idéia de reciprocidade programada em nossas mentes.

A revista The Economist diz: "A grande descoberta foi a identificação do papel da confiança (trust) como eixo da evolução humana... Confiança permite que estranhos colaborem, por meio de um processo que envolve a contabilização de quem faz o que e quando, e também a punição dos fraudadores. Fora os primatas, só os morcegos confiam assim em estranhos (não parentes), mas o mecanismo é o mesmo: morcegos bem alimentados regurgitam uma parte do alimento para colegas que estão famintos, e fazem isso esperando a retribuição quando forem eles que estiverem famintos".

Matt Ridley, autor de livros clássicos sobre esse tema, diz que a reciprocidade é como uma espada de Dâmocles sobre nossas cabeças. Repare como nosso dia-a-dia está cheio de manifestações como as seguintes: "Nós já os convidamos duas vezes para jantar em nossa casa, e eles nunca retribuíram"; "Ele só está me convidando para a festa para que eu fale bem dele em minha coluna na revista"; "Depois de tudo que eu fiz por ele, como ele pode agir assim comigo?"; "O que eu fiz para merecer isso?"; "Você me deve essa". Obrigação. Dívida. Barganha. Contrato. Troca. Acordo. Nossa linguagem e nossas vidas são permeadas pela idéia de reciprocidade.
Quando estamos em ambientes em que se exercita cooperação e reciprocidade, nosso instinto de cooperação nos levará a cooperar também. Nossas mentes tiram uma amostra da população ao redor e, se as pessoas são cooperativas, tornamo-nos como elas. Em um ambiente trambiqueiro, porém, cujas normas sociais não dão suporte à cooperação, nosso software nos torna permanentemente desconfiados. Todo mundo protege o próprio traseiro.

Países inovadores têm sistemas operacionais que levam a tecnologias sociais robustas, que garantem alto nível de cooperação baseada em reciprocidade. Os módulos desses sistemas operacionais são os elementos do "conto dos países inovadores". Não há nenhum país com cultura forte em todos os elementos do sistema operacional. Também não há maneira única de implementar esses elementos. O que estou dizendo é que todos os países inovadores têm, em média, registros favoráveis em todos os elementos, mesmo que seus sistemas operacionais sejam, como são, bem diferentes.

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