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Dogmas que impedem a inovação

Revista Época Negócios Edição 19 - Agosto de 2008 - Por Álvaro Oppermann

O nome de Clayton Christensen, professor de administração em Harvard, é citado com freqüência pelos estudiosos da inovação desde que publicou, em 1997, uma das obras seminais sobre o tema, O Dilema da Inovação. Nestes onze anos, Christensen não parou. Em 2000, ele criou a Innosight, companhia de investimentos e consultoria, com escritórios em Massachusetts, na Índia e em Cingapura. A Innosight provou ser um celeiro do melhor pensamento sobre a inovação, como demonstra o lançamento recente de The Innovator’s Guide to Growth (“O guia do crescimento para o inovador”) pela Harvard Business Press, escrita por quatro profissionais do círculo de Christensen. Apesar de não contá-lo entre os autores (ele apenas assina o prefácio), a obra é um poderoso desdobramento do pensamento do mestre.

“Quando eu criei a Innosight, o motivo principal foi o de reconhecer uma limitação no meu cérebro. Os padrões de rupturas de inovação – a disrupção, para usar um neologismo da administração – eram tão cristalinos para mim que eu passei a subestimar a dificuldade real de criar novas ondas de crescimento nos negócios, especialmente em grandes corporações”, admite no prefácio. Esse estilo realista, “pé no chão”, dá o tom da obra, entre cujos autores estão Scott Anthony, seu principal pupilo e presidente da Innosight, responsável pelo projeto Newspaper Next, de recuperação e adaptação dos jornais americanos às novas mídias, e Elizabeth Altman, vice-presidente de estratégia da Motorola. O pressuposto da Innosight – que pode ser classificado como contra-intuitivo – é o de que os princípios da boa administração podem inibir a empresa de alcançar a excelência nas mudanças de sucesso. As pesquisas ali desenvolvidas apontam que inovações pouco dispendiosas, simples e práticas podem conquistar mercados e desbancar líderes.

Um dos paradigmas falhos da administração, segundo os autores, é o de que a empresa deve priorizar ouvir os melhores clientes. Isso é uma meia-verdade. Companhias que focam apenas essa fatia seleta acabam por produzir produtos e serviços que são bons demais, ou complexos demais, para o grosso dos consumidores. Isso, aliás, faz lembrar a piada do comediante americano David Sedaris, da revista The New Yorker: “No passado diziam que o computador seria tão fácil de usar quanto o celular. A profecia se concretizou: hoje eu não consigo mais usar o meu celular”.

Um capítulo especialmente interessante trata da identificação dos “não consumidores” – clientes em potencial que não estão consumindo por motivos diversos, como falta de conhecimento (dificuldade de uso do produto), falta de condições financeiras, falta de acesso (não ter onde comprá-lo) ou falta de tempo. Identificar e remover essas barreiras chega às vezes a ser mais difícil do que desenvolver um novo produto. O que não faltam no mercado são oportunidades de crescimento. Num estudo recente nos Estados Unidos, lembrado pelos autores, foram identificados 30 usos inusitados para secadores de cabelo, entre eles secar tinta fresca. Utiliza-se o secador de improviso, por falta de produtos adequados. Christensen cita outro exemplo: “Na indústria automobilística americana, apesar da crise, nenhuma montadora se preocupou com o crescente número de profissionais que usam o carro apenas para o trabalho. Este é um público virtualmente ignorado”.

As empresas também estão segmentando os mercados de maneira equivocada, julgam os autores. Isso pode soar como temeridade, mas os argumentos são convincentes. A segmentação clássica obedece critérios de categoria e preço, perfil de consumidor (idade, sexo, localização geográfica e renda), ou, no caso do business to business, os segmentos de indústria e a estatura do negócio. Essa abstração não é muito útil, por ser estática. “Os padrões de compra variam mais do que análises demográficas ou psicográficas podem mostrar”, diz Christensen. “Nenhuma demografia explica por que um homem leva a namorada ao cinema e para jantar fora num dia, e no outro pede uma pizza e um DVD pela Netflix (locadora americana com sistema de encomendas online).”

Por fim, o livro faz uma advertência importante, nestes tempos de tantas rupturas: a empresa pode se ver tentada a achar que “o diferente” é sinônimo de “disrupção”. Nem sempre. A disrupção é uma forma de inovação, medida por resultados. O “diferente”, muitas vezes, pode ser apenas uma mudança extravagante nos rumos da empresa. Outro lembrete é de que ela não está confinada à seara da tecnologia. A ruptura inovadora diz respeito muito mais ao modelo de negócio. Lições do celeiro de talentos de Christensen.

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