Assino embaixo as idéias do consultor Nikos Mourkogiannis. Seu livro está no topo da minha lista dos Livros a Serem Adquiridos.
Revista Época Negócios nº 2
Para o consultor Nikos Mourkogiannis, o que projeta uma empresa para o futuro São os princípios, e não os lucros
O consultor de empresas Nikos Mourkogiannis tem, atrás de si, uma biografia densa e acidentada. Nascido na Grécia, onde o pai quase foi morto por guerrilheiros comunistas, estudou administração em Harvard, nos Estados Unidos e, lá, construiu para si mesmo uma sólida carreira na indústria de armamentos. Quando a guerra fria terminou, retornou à universidade e, de lá, saiu para trabalhar na Monitor Company, consultoria fundada por Michael Porter, seu professor. Desde então, visitou dezenas de países, conversou com centenas de executivos de multinacionais, e extraiu dessa rica experiência material para escrever, aos 55 anos, seu primeiro livro. Purpose, the Start Point of Great Companies (Propósito será o título da edição brasileira) é um livro de negócios inusual. Sua principal preocupação não é a última linha de balanço ou a forma mais eficaz de liquidar a concorrência. Mourkogiannis escreve sobre princípios, moral, ética. Propósito, diz ele, é o DNA moral da empresa. É aquilo em que ela acredita sem precisar nem pensar. "Propósito", afirma, "é o motor moral de uma companhia, a fonte da sua energia." Sem essa diretriz original, ele acredita que as empresas são incapazes de triunfar no longo prazo, de mobilizar lealdades, de atingir real grandeza. Podem ter lucros, podem dar certo por algum tempo, mas, destituídas de norte, perdem-se e declinam.
Essa não é uma conversa comum em tempos de turbocompetição. O autor constrói uma tipologia com quatro tipos de empresas muito diferentes entre si, mas motivadas por igual sentido de direção. A Microsoft de Bill Gates, assim como a Ford de John Ford, ilustram o tipo heróico, baseado na liderança e na ousadia de seus fundadores. Intel e IBM exemplificam o modelo de descoberta, movido a pura inovação. Excelência serve de parâmetro para definir companhias como Apple e BMW,obcecadas pela perfeição. Finalmente, há as companhias altruístas, como Wal-Mart e Body Shop, cujo fundamento moral (ao menos de início) era fazer o melhor pelos consumidores. Se isso parece um tanto arbitrário e mesmo alheio ao espírito do tempo, Mourkogiannis dá de ombros. "Não me importo de estar em desacordo. Eu nem me importo de estar fora da corrente", diz ele. "O que me importa é, de alguma forma, fazer a diferença." A entrevista que segue foi feita no escritório em São Paulo da Booz Allen Hamilton, a quem a consultoria londrina Phantea, de Mourkogiannis, é associada.
Por que o presidente de uma empresa deveria empregar o tempo dele para ler seu livro? 99,99% dos livros de negócios estão preocupados em ensinar as pessoas a fazer coisas. São livros do tipo "como". Mas acho que, tão importante quanto "como", é "por quê". Você pode ter a melhor execução do mundo, mas, se por trás dela não houver um propósito que valha a pena, ela tem pouco ou nenhum valor. Meu livro nos leva de volta aos fundamentos: por que uma empresa existe? Qual é seu propósito? Somente tendo uma idéia clara do porquê de uma companhia existir se pode responder perguntas mais simples, como quando, quem e o que se deve fazer.
Mas, insisto, por que executivos bem-sucedidos deveriam se preocupar com "porquês"? Se eu conseguir fazer com que um em cada mil presidentes me escute, minha missão estará cumprida. Espero fazer diferença dando início ao diálogo com alguns poucos. A audiência que eu procuro com meu livro é a das pessoas que entendem que há algo para além do sucesso pessoal.
Uma resenha de seu livro diz que o senhor considera o lucro uma distração em relação aos propósitos da empresa. É isso mesmo? Seguramente, não. Mas há executivos, sobretudo nos Estados Unidos, pessoas de seus 40 anos, com mulheres loiras novinhas em folha depois do primeiro divórcio, que vão pelo mundo afora fazendo discursos sobre maximizar lucros e produzir valor para os acionistas. Para eles isso é tudo. Mas eu digo a meus clientes: ninguém vai segui-los motivado apenas pela maximização de lucros. O que isso significa para as dezenas de milhares de empregados que movem uma companhia? Isso não tem apelo para a maioria das pessoas.
Milton Friedman costumava dizer que toda vez que as empresas se metem a fazer coisas diferentes de produzir lucro, acabam fazendo besteiras. O senhor discorda? Milton dizia essas coisas com base no melhor conhecimento disponível na época, mas era apenas um economista. O fato é que cada um vê o mundo à sua maneira. Para um advogado, a corporação é um contrato. Para um sociólogo, é uma organização. Para um economista, é uma máquina de maximização de lucros. Friedman era muito consistente quando descrevia uma corporação do ponto de vista econômico, mas ela não é apenas uma unidade econômica. Nos últimos anos, as corporações ganharam importância muito maior do que qualquer um pudesse prever. No futuro, quando se for escrever a história do período em que estamos vivendo, eu acho que ele será definido como a época em que as corporações superaram os Estados nacionais. E quando você, como empresa, precisa mobilizar a lealdade de dezenas de milhares de pessoas ao redor do mundo, não adianta apenas falar de lucros. Para mim, as corporações são os grandes tijolos da sociedade global.
É possível enfrentar a competição brutal de mercado e ainda ser fiel a princípios morais, como o senhor propõe? Sejamos claros a respeito disso: ninguém precisa de propósitos para ser competitivo. As empresas precisam de um propósito quando se dispõem a ser uma instituição de longo prazo. Propósito não é um jogo para qualquer um, não é um jogo para quem quer apenas ser competitivo. Propósito é para aqueles que aspiram a grandeza. Se você quer ser apenas bom, não precisa de propósito. Você pode ser competitivo mesmo sem ter nenhum propósito, mas, se quer ser reconhecido como grande, então você tem de ter propósitos.
Do modo como o senhor fala, parece haver alguma contradição entre ter propósitos e ser uma empresa competitiva... Na minha visão não há contradição, porque você só pode ser competitivo no longo prazo se tiver princípios e propósitos. Porém, do ponto de vista do contador, haverá contradições, porque os propósitos às vezes podem exigir que você sacrifique o crescimento por um ano ou dois. Você pode ter mesmo de sacrificar a lucratividade. Logo, depende da perspectiva: você está pensando em seis meses, dois anos ou 12 anos? Em uma perspectiva de 12 anos, propósito e competitividade são quase a mesma coisa. Mas no curto prazo pode, sim, haver contradições.
O senhor inclui o Wal-Mart, uma empresa controversa, em sua lista de empresas éticas... Foi por isso que insisti, a despeito da opinião de meus editores, em incluir o exemplo do Wal-Mart no livro. A empresa costumava ser grande quando tinha um propósito, mas o perdeu - e a maior evidência disso é a maneira ruim como passou a tratar os funcionários. Porque os melhores clientes de Sam Walton, o fundador do Wal-Mart, eram seus empregados. A perda de propósito da empresa ocorreu quando os sucessores de Walton decidiram fazer o máximo de lucro, independentemente do que isso custasse em outros termos.
O senhor está ciente de que as pessoas estão mais voltadas para aspectos financeiros e menos para questões éticas? Eu concordo com você inteiramente. Não há muita gente levantando o tipo de questão que eu levanto. Mas não me importo em estar em desacordo. Eu nem me importo em estar fora da corrente. O que me importa é, de alguma forma, fazer a diferença.
O que, em sua biografia, o autoriza a dar conselhos a pessoas poderosas e bem preparadas, como presidentes de empresas? Eu tive muita sorte. Tive a oportunidade de cometer muitos erros: em minha carreira de acadêmico, de executivo, de consultor. Trabalhei em mais países do que qualquer outra pessoa que conheço. Portanto, tive oportunidade de cometer muitos erros em diferentes ambientes. Essa é minha experiência. Ela me ensina que quando fui ineficiente em resolver problemas foi porque eu não desci fundo o suficiente em suas causas.
Lendo seu livro, as pessoas podem ter a impressão de que o senhor vê nos resultados financeiros algo secundário. Eu me importo muito com resultados. Porém, a questão é que há mais de um tipo de resultado na vida das empresas. As companhias não competem apenas no mundo financeiro, mas por talentos, por inovações, e no mundo das idéias morais, que definem as regras do jogo.
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