29.5.08

Fuja da Normose

Fique atento, ou você e sua empresa poderão ser engolidos pela síndrome da normalidade.

Por Jerônimo Lima - Consultor em Gestão Estratégica e Gestão do Conhecimento e Conferencista (jeronimo@mettodo.com.br)

“Normose” é o termo criado pelo filósofo francês contemporâneo Jean-Yves Leloup para designar um tipo de patologia moderna caracterizada pela aceitação de comportamentos pessoais e sociais nocivos sem question amento. A pessoa acometida da doença passa a agir como se estivesse acostumada a certas atitudes que, mesmo lhe trazendo prejuízos significativos, sequer critica.

Um exemplo de normose é quando um indivíduo assiste a escândalos de desvios de dinheiro público por políticos ou a cenas de corrupção e violência urbana sem se abalar, como se isso fosse corriqueiro e aceitável.

Por causa dessa conivência, as pessoas ficam esperando que as autoridades façam algo a respeito, mesmo sabendo que não farão ou não têm condições de fazer. No sentido mais restrito de nossas vidas, a normose é manifestada pelos pequenos maus hábitos, que vão sendo tolerados e denigrem, gradativamente, nossa cultura e nossos valores.

O grande prejuízo decorrente dessa patologia é que ela inibe o bom senso, a iniciativa e a criatividade de umas poucas mentes inquietas e corações inconformados que querem construir uma sociedade mais justa e próspera. Em geral, consideram os como normal tudo o que a maioria das pessoas pensa, sente, acredita e faz. Ou seja, há uma espécie de padrão que guia o comportamento de todo mundo. O comportamento normótico, enquanto doença, é realizado inconscientemente.

Bem, mas o que isso tem a ver com o mundo dos negócios? No meio empresarial, normótico é aquele gestor que vive de modismos, envolto em teorias superficiais, que gasta a maior parte de seu tempo assimilando referências vazias e sem sentido. Assim, vai adquirindo padrões duvidosos de gestão apenas porque os considera normais, sem ao menos analisar sua real eficácia. É também o empresário que permite a pirataria de software ou que faz vista grossa às relações trabalhistas irregulares em sua empresa, alegando que “todo o mundo faz” ou que “pode ser que assim o governo pare de cobrar tantos impostos”.

Felizmente, a despeito dessa realidade, à medida que o conhecimento avança e é disseminado, descobrimos que muitas normas sociais e empresariais ditadas pelo consenso já não têm valor e, portanto, devem ser abandonadas ou substituídas. O normal vira anormal. Nos casos em que a normose é identificada, o tratamento para eliminá-la, chamado normoterapia, começa com a divulgação dos seus efeitos prejudiciais e passa pela adoção de medidas no plano pessoal e profissional.

É por isso que cada vez mais os profissionais mais talentosos são aqueles que têm insights transformacionais. Buscam isso constantemente, precavendo-se de sintomas típicos da normose como a obsessão pela especialização, o gosto por fofocas, a preferência em falar de pessoas e não de idéias, inautenticidade por não deixar transparecer seus sentimentos, compulsão à mentira e impaciência para refletir sobre seus problemas de modo a resolvê-los definitivamente.

No instigante livro Primeiro, Quebre Todas as Regras, de Marcus Buckingham e Curt Coffman, descrevem o comportamento dos avessos à normose empresarial. Os profissionais que não aceitam nada menos que o ótimo estão sempre se fazendo perguntas como estas: “O que recebo aqui?”, “O que dou em troca?”, “Pertenço a es te lugar?”, “Como posso crescer aqui?”. Este questionamento persistente incentiva à fuga dos padrões normóticos, estimula o debate, a criatividade e a inovação na vida pessoal e corporativa.

Para avaliar seu estágio como normótico, sugiro que pense sobre as questões a seguir, complementares às citadas acima:

1) Sei o que esperam de mim no meu emprego?
2) Estou satisfeito trabalhando nessa empresa?
3) Tenho todos os recursos que preciso para realizar eficiente e eficazmente o meu ofício?
4) No oportunidade de fazer o que faço de melhor todos os dias?
5) Recebi, na última semana, algum reconhecimento ou recompensa por meu bom desempenho?
6) Meu superior imediato se preocupa comigo como pessoa?
7) A empresa onde trabalho incentiva meu desenvolvimento?
8) Minhas opiniões são levadas em consideração?
9) A missão da empresa onde trabalho é nobre a ponto de me fazer sentir importante pelo que faço?
10) Meus colegas de trabalho são comprometidos com a qualidade do que fazem?
11) Tenho pelo menos um de meus melhores amigos trabalhando na mesma empresa que eu?
12) Nos últimos seis meses, alguém na empresa me deu feedback sobre meu desempenho?
13) No ano passado, tive oportunidade de aprender algo novo?
Se você responder “não” a três ou mais questões, avalie se já não está num estágio avançado da patologia e comece a mudar já. Fuja da normose. Esse é o único jeito capaz de transformar conhecimentos em projetos inovadores.

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